Eu sou do tempo em que na Semana
Santa se pedia a benção à mãe e ao pai de joelhos, dentro de casa não podia
falar alto, palavrão nem pensar. O bom é
que a gente ficava toda a semana sem apanhar, mas quando chegava sábado de
aleluia, ai ai, o coro comia. E toda sexta-feira santa lá ia eu almoçar na casa
de Maria de Gaspar (minha mãe de leite, Gaspar era o nome do marido dela), eu
adorava, porque além de ser muito paparicada por toda a família de mãe Maria,
depois do almoço eu gostava de ir ao chafariz que ficava ao lado da casa dela,
para ouvi as conversas das mulheres que iam lá para lavar pratos, pois muitas
não tinham água encanada em casa, e outras porque adorava ficar jogando
conversa fora mesmo. E era cada história que saia, ai, ai. Semana Santa então,
“Ave Maria”! Era cada história, lembro de uma vez que uma lavadeira contou a
seguinte história: “Que numa sexta-feira santa, uma mulher estava lavando
pratos e xingou o nome da “pelada” (palavrão) e dai no mesmo instante à água
ficou coberta de sangue”. Verdade ou não eu acreditava e morria de
medo, essa semana santa então era coisa para se respeitar mesmo.
Lá em Gurupá-Mirim, minha cidade natal, tinha
um senhor que segundo a lenda (a língua do povo) virava lobisomem na
sexta-feira santa, nossa eu tinha pavor a ele, e para piorar a situação, quando
eu passava em frente a casa dele, que
ficava numa ladeira, ele me chamava de minha netinha, meu Deus eu ficava
imaginando aquele homem virando lobisomem, então sai em disparada ladeira a
baixo, corria para casa apavorada, minha imaginação sempre foi fértil ne. Era
tanta história que o povo contava na semana santa e o ano inteiro, porque
cidade pequena sabe como é, ainda mais em outros tempos. Histórias de
assombração, pai da mata, a Iara que morava no rio....História de pescador
então era um monte, meu pai quando saia
para pescar em noite de lua cheia, chegava com o caçuá cheio de peixes e muitas
histórias para contar e também muitos carrapatos para eu tirar.
Sinto falta de hoje em dia as
pessoas não darem mais tanta importância às coisas mais simples, as crendices,
aos sinais da natureza, semana santa hoje em dia tornou-se mais uma data
comercial para as pessoas comparem muita comida e comprar ovos de pascoa
caríssimos para as crianças, (que as mães se sentem obrigadas a comprar,
tamanho é o apelo midiático e do comércio) crianças que só ouvem falar de um
coelho de páscoa, muitas nem sabem do real significado da semana santa, muito
menos ouvem falar de histórias de rios, Iaras, pai da mata. Entendo que os
tempos mudaram que a tecnologia avançou, as cidades cresceram e os costumes
sãos outros, mas tem coisa que eu ainda sinto falta de; Como eram no meu tempo.
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